É difícil escolher alguma coisa específica de nosso semestre na Maré para compartilhar em nosso relatório de turma. Mas se fossemos escrever todas as riquezas vividas, precisaríamos de um livro, com capítulos sobre cada pedacinho do nosso dia: o tempo livre nos espaços, nosso galinheiro, nossa floresta, nosso quintal, nossa quadra, biblioteca e espaço de jogos. Para além dos ambientes poderíamos falar sobre nossas construções de casinhas, nossas brincadeiras simbólicas no tanque de areia, nossas brincadeiras corporais, nossos cantos de massagem ou nossos jogos da tradição, poderíamos também falar sobre nossas rodas de violão, ou nossas conversas ao redor da fogueira. Uau! Que vontade de contar de tudo! Infelizmente não é possível, então optamos em selecionar um pequeno pedacinho do que achamos mais rico. E sem dúvida nenhuma esse foi um semestre rico em projetos.
Perseguir e identificar projetos de interesse coletivo das crianças da primeira infância não é fácil. É preciso ter uma escuta atenta, saber o que devemos responder e o que eles devem responder por si. Saber o momento de instigar e o momento de espairecer. E até saber quando o projeto deve ter seu fim, para que o interesse não vire desinteresse.
Logo no início do semestre tivemos uma questão muito forte do medo das crianças: medo do espaço, medo de desafios, medo de provar comidas estranhas. Que modo melhor de superar um medo do que encará-lo, falar sobre ele, vê-lo de frente, nomeá-lo e simbolicamente combatê-lo. Nunca foi nosso objetivo que as crianças não tivessem mais medo, mas que elas tivessem uma oportunidade de olhar os medos para compreender e dar formas e nomes às terríveis sensações que os assombravam.
Iniciamos com atividades simples, identificando os medos que eles tinham. Alguns que eles já conheciam, outros que só foram organizados depois que seus amigos falaram sobre eles. Foram algumas semanas dizendo, desenhando, pintando esses medos. Nesta hora também, lemos diversas histórias sobre a temática, assim como “Gildo”, “Vai embora grande Monstro Verde”, “O Urso corajoso” e “Chapeuzinho Amarelo”. Depois chegou a hora de contrapor e enfrentar alguns destes temas. Fizemos o túnel do medo em que eles tinham que passar por um túnel escuro com barulho de trovões, colocamos a mão em caixas misteriosas com coisas espinhosas, melequentas, e até caixas tenebrosas que não tinham nada dentro. Fomos brincar com o escuro, medo recorrente entre muitas crianças. Brincamos com as sombras nas paredes, e a professora Elen até criou uma história sobre uma criança com medo do escuro e a contou com desenhos projetados em uma sala escura. Desta história surgiu a ideia de fazermos uma luminária com as crianças, foram dias pintando as diversas partes de nossa luminária e quando finalmente chegou o dia de acendê-la, Uau, as crianças ficaram encantadas com sua própria construção e nossa luminária foi utilizada diversas vezes para nossas rodas de violão e de leitura.
Em meio a esse projeto acontecendo e tomando forma, que grata surpresa foi ouvir alguns pais dividindo seus medos com seus filhos. Uma riqueza desta, tínhamos de compartilhar com todas as outras famílias. Daí nasceu uma outra etapa de nosso projeto. Nossos queridos pais sempre nos ajudam a superarmos os nossos medos, e se dessa vez nós os ajudássemos a superar os deles? Dessa provocação, elencamos todos os medos que os pais nos relataram por seus generosos desenhos. Então, começamos a enfrentá-los um a um. Medo de cobra: manipulamos nossas cobras dos potes do Canto das Coisas Interessantes. Medo de chuva: saímos na chuva de guarda chuva! Medo de altura: com equipamento de proteção, escalamos uma enorme escada que ia até o teto da escola. Medo de morcego: olha só novamente os bichos dos potes. Medo de taturana: pegamos algumas de nosso quintal! Foram dias e dias de muitas emoções. E o resultado enviamos agora de presente para vocês em um quadro de fotos para que possam ver o quanto seus filhos foram corajosos.
Mas todo projeto tem um tempo, principalmente na educação infantil. E aos poucos fomos percebendo o esgotamento desta temática. Mas, enquanto uma temática descansa, outra vai ganhando força. E as nossas lagartas e taturanas que habitavam o aquário de nosso espaço começaram a ficar cada vez mais interessantes. Nossa primeira habitante foi achada por uma criança. Depois outra e outra. A Regina e a Cátia vieram contribuir com seus conhecimentos e até um livro de lindas fotografias nos emprestaram. Enquanto observamos o processo de transformação ocorrendo em nosso aquário, brincamos de nos transformar em lagartas com uma pintura de carimbos de rolha. Nos transformamos em casulos costurando nossa imagem e adentrando um tecido de circo. Por fim, brincamos de transformar nossos dedos em borboletas com recortes de cartolina. E não é que um de nossos casulos se tornou uma bela mariposa? Fomos até a floresta soltá-la em nosso quintal e nos despedir dela!
E para finalizar nosso mês de junho, não podia ter outra temática se não uma das mais tradicionais festividades de nosso país. Nossa querida festa junina. Cantamos, dançamos, cortamos bandeirinhas, lanternas, balões, pulamos fogueira!
Ufa! Esse foi um delicioso e cheio semestre. Cheio de descobertas e de investigações. E se não fosse o período de férias, iríamos começar mais um tema que as crianças já estão muito curiosas em pesquisar. Mas, deixemos um pouco para depois! rs.
Esperamos que possam aproveitar bem as férias de inverno em família. Com muito calor advindo de abraços apertados e de lareiras/fogueiras bem quentinhas.
Um enorme abraço de toda equipe do infantil da tarde.
Boas férias!
texto do professor ERIC ITO