Nasceu Martina, minha neta. O parto se deu em casa, de um modo bem humano, incomum para esses dias tão cheios de intervenções médicas e medicamentosas.
Ela chegou e com ela nasceu uma mãe, um pai, avós, tios e tias… Estamos todos em fase de adaptação aos novos papeis e funções, mas sabemos mesmo que a grande adaptanda é a bebê recém chegada ao planeta. Ela tem muito a conhecer, perceber, sentir, ver, ouvir, tocar, aprender.
Semana passada tomei o tempo da reunião do F1, na terça de tarde, para uma conversa com a Karina F e com a Thaís sobre a Maré, porque elas são novas na nossa equipe e sabemos como é difícil, especialmente para quem já trabalhou em outra escola, se desconstruir e viver os desafios diários de ser professora aqui.
Falamos da infância, das percepções de cada uma sobre bons e maus momentos em sua vida escolar, do entendimento do que é ser um professor. Assistimos vídeos da Viviane Mosé, Rubem Alves e Paulo Freire. A fala forte que ficou pra mim foi: O PAPEL DO PROFESSOR É GERAR DEMANDA.
Levantamos alguns adjetivos para a boa professora: curiosa, justa, amorosa, pesquisadora, autônoma, respeitosa, determinada, comprometida com a educação, pensante, boa leitora, alegre, sem preconceitos… Ufa, que tanto, hein!? Bem, acredito principalmente que a boa professora está sempre em transformação, ela acolhe as transformações que vive, que vivem no seu entorno, problematiza e busca soluções. Ela percebe a amplitude dos aprendizados no dia a dia. Ela se liberta de grilhões e olha o mundo sob telescópios distintos, por isso vê o importante nas diversas perspectivas, ou seja, no gigante e no minúsculo. Transformações. Adaptações.
Temos duas meninas novas na escola, F e L. Uma no Infantil, uma no Fund1. Elas moram há pouco tempo na Granja Viana, e antes de virem para a Maré estiveram numa escola próxima, mas tradicional. Lá, segundo a mãe, as meninas desenvolveram séria aversão à escolas. Antes moravam em SP, e estudavam num colégio grande e acolhedor. Fizeram a EI na TEARTE, com a Teresita (saudades!)
Embora estivessem desconfiadas de adultos, essas meninas sabem a dose de respeito que merecem! Aos poucos vamos vencendo etapas da adaptação e elas vão compreendendo que escola é essa aqui. No primeiro dia ouvi: “Isso é uma escola ou um parque de diversões?”Que pergunta dolorida. Fiquei pensando no quanto se poda a infância para que uma menina de 5 anos faça uma pergunta dessa. Ela já se adaptara ao “sentada e calada”!?
E depois de uns 3 dias, a outra disse para a mãe: “Eu gosto da gentileza das pessoas da Maré”. TUM, TUM, TUM – meu coração tamborilou alegria!
Hoje enviei uma mensagem aos familiares das crianças que em 2024 serão do Grupo de Letrinhas, o grupo que em 2025 estará no Fundamental. A ideia é contar para esses adultos o que acontecerá no próximo ano, um ano de transição para eles. O nosso jeito de cuidar de mudanças costuma ser ajudar fortalecendo os indivíduos para que as mudanças sejam vividas com coragem e prazer. Mudanças! Transições! Adaptações!
Hoje o professor Rodrigo (F1) e a professora Mônica (Letrinhas) combinaram de levar juntos os seus grupos para a floresta, pois estão focando em atividades nas quais as crianças do Fundamental acolham as do Grupo de Letrinhas deste ano. Foi bonito de ver a ensinagem do uso de ferramentas partindo das próprias crianças. Usar serrote e facão é um desafio bom nessa idade. Sabemos que desafio é bom quando é difícil, mas possível. A técnica de como fazer para não correr risco de se machucar e também não machucar as pessoas do entorno era verbalizada, exibida e depois usada pelas crianças menores. O orgulho estava estampado no trio de ensinantes= G, Ma e Mi, crianças de 10 anos ensinando crianças de 6anos. Eu sai de lá tão leve, tão contente por constatar que as mudança e as adaptações estão sendo olhadas permanentemente.
Exatamente nesse momento em que estou escrevendo 3 meninos, (grupo de transição do F1 para o F2) estão com o professor Rodrigo. Eles se encontram duas vezes por semana, durante uma hora, para conversas sobre o que vem pela frente em sua vida escolar e também sobre a história que viveram aqui. Esses três estão conosco desde as fraldas, agora já tem 11 anos. Acompanhar esse último ano deles aqui na escola é uma estranha mistura de orgulho e dor. Quero confiar que estão prontos para viver novas mudanças e adaptações. Esse é um heart print que a Maré intenciona produzir nas crianças, além do amor à natureza, e desejo de resolver problemas.
Começos, meios, encerramentos,…recomeços, meios, encerramentos,…nada termina. Me veio agora a imagem de um grande símbolo de transformações ininterruptas… ovos, lagartas, casulos, borboletas, ovos, lagartas, casulos… transmutações, transfigurações, adaptações, enfrentamentos, mudanças! VIDA!
Regina Pundek